Emendas parlamentares: entenda impasse entre STF e Câmara

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A Câmara dos Deputados aguarda a análise do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre as explicações prestadas a respeito do repasse das emendas de Comissão.

O ofício encaminhado pela Casa Legislativa na noite de sexta-feira (27) é uma resposta a um pedido de Dino.

No último dia 23, o ministro suspendeu o pagamento de R$ 4,2 bilhões em emendas parlamentares. O ministro também mandou a Polícia Federal (PF) abrir inquérito para investigar o caso.

Dentre as determinações, o magistrado havia dado até as 20h de sexta para que a Câmara divulgasse as atas das reuniões em que a indicação e a aprovação das emendas de comissão teriam sido realizadas.

No ofício encaminhado ao ministro, a Câmara reforçou o argumento de que não houve ilegalidade e que a indicação dos recursos foi feita “sob orientação jurídica” do governo federal.

A Casa não enviou, no entanto, as atas que comprovam a indicação das emendas de Comissão, conforme Dino havia determinado.

A execução das emendas parlamentares tem sido alvo de discussões entre os Poderes ao longo de todo o ano.

O que são emendas parlamentares?

As emendas parlamentares são instrumentos utilizados por deputados e senadores que permitem que alterações sejam feitas no orçamento anual.

Elas podem ser usadas, por exemplo, por parlamentares para enviar recursos a estados e municípios.

As emendas podem ser:

  • Individuais [de transferência especial (Pix) ou de transferência com finalidade definida]: propostas por cada parlamentar;
  • Bancada: de autoria das bancadas estaduais no Congresso Nacional;
  • Comissão: apresentadas pelas comissões técnicas da Câmara e do Senado, bem como as propostas pelas Mesas Diretoras das duas Casas;
  • Relator: de autoria do parlamentar que, naquele determinado ano, foi escolhido para produzir o parecer final sobre o Orçamento. Há ainda as emendas dos relatores setoriais, destacados para dar parecer sobre assuntos específicos divididos em dez áreas temáticas do orçamento.

São obrigatórias, ou “impositivas”, as emendas individuais e de bancada.

Quais são as ações no STF?

O ministro Flávio Dino é relator de diferentes ações no STF sobre a execução de emendas parlamentares. São elas: ADPF 854 (Orçamento Secreto), ADI 7688 (Emendas Pix), ADI 7695 (Emendas Pix) e ADI 7697 (Emendas Impositivas).

Um dos principais acontecimentos no âmbito das ações foi a decisão do STF de declarar a inconstitucionalidade das indicações de despesas por deputados e senadores para o chamado orçamento secreto. Em dezembro de 2022, o STF entendeu que as emendas chamadas RP9 (Emendas de Relator) eram inconstitucionais.

Após a decisão, o Congresso Nacional aprovou uma resolução que mudou as regras de distribuição de recursos por emendas de Relator para cumprir a determinação da Corte.

O PSOL entendeu, porém, que a decisão continuava em descumprimento. Após a aposentadoria da ministra Rosa Weber, relatora original do caso, Flávio Dino assumiu a condução do processo.

Relembre as decisões de Flávio Dino

Em 18 de abril deste ano, o ministro Flávio Dino solicitou aos Poderes informações sobre cumprimento da decisão do Supremo que barrou o orçamento secreto.

No dia 17 de junho, após manifestação do Ministério do Planejamento, foi identificado o uso de outras dotações orçamentárias, a exemplo da RP8 (Emendas de Comissão), em substituição à RP9, seguindo as mesmas práticas de ausência de transparência e rastreabilidade já vedadas pelo STF. Diante disso, uma audiência foi marcada para o dia 1º de agosto.

Em 1º de agosto, Dino abriu a audiência de conciliação com representantes do governo, do Congresso e de órgãos de controle e fiscalização para discutir o integral cumprimento da decisão da Corte que barrou o chamado “orçamento secreto”.

Dentre outras medidas, o ministro estabeleceu que parlamentares só poderiam destinar emendas aos estados pelos quais foram eleitos, proibindo, portanto, os repasses a outras unidades de federação.

No mesmo dia, Dino também determinou que as chamadas “emendas Pix” deviam seguir regras de transparência e garantir mecanismos para permitir o seu rastreio e fiscalização.

No dia 8 de agosto, o ministro decidiu autorizar excepcionalmente a continuidade da execução dessa modalidade de emenda para os casos de obras em andamento e de calamidade pública.

Em 14 de agosto, o magistrado determinou a suspensão de todas as emendas impositivas apresentadas por congressistas ao orçamento da União até que fossem criadas regras de transparência e rastreabilidade dos recursos.

Ficaram de fora da suspensão os recursos destinados a obras já iniciadas e em andamento ou a ações para atendimento de calamidade pública formalmente declarada e reconhecida.

O ministro também determinou que a Controladoria-Geral da União (CGU) auditasse os repasses dos parlamentares por meio das emendas do orçamento secreto.

No dia 16 de agosto, o plenário do Supremo formou maioria para manter as decisões de Dino.

Em 20 de agosto, representantes dos Três Poderes da República divulgaram uma nota conjunta dizendo que havia sido firmado um “consenso de que as emendas parlamentares deverão respeitar critérios de transparência, rastreabilidade e correção”.

Em 10 de outubro, representantes do Executivo e do Legislativo fizeram uma audiência de conciliação para discutir medidas tomadas para acabar com o chamado “orçamento secreto”.

Após a reunião, o ministro manteve suspensa a execução das emendas de relator (RP 9) e de comissão (RP 8).

Nas semanas seguintes, o Congresso elaborou e aprovou a lei complementar 210/2024, que criou regras para a execução das emendas. A lei foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 26 de novembro.

Com a aprovação da legislação, o ministro Flávio Dino liberou o pagamento das emendas parlamentares no dia 2 de dezembro.

Na ocasião, o magistrado decidiu que a execução dos recursos deveria obedecer regras conforme cada tipo de emendas.

  • Emenda de Relator (RP 9) e Emenda de Comissão (RP 8) anteriores a 2024: liberadas desde que seja feita a identificação dos parlamentares. Cabe ao Executivo checar a transparência e liberar o recurso, caso a caso;
  • Emenda Pix (RP 6): liberadas com a apresentação do plano de trabalho prévio. Para as emendas anteriores a 2025, Dino deu prazo de 60 dias para sanar ausência de plano de trabalho;
  • Emenda de Bancada (RP 7) e Emenda de Comissão (RP 8): não deve haver individualização da emenda. Fica proibida a chamada “rachadinha” das emendas de bancada, ou seja, o rateio ou pulverização dos recursos entre parlamentares. A partir de 2025, todo o processo de escolha precisa estar devidamente documentado.

O STF formou maioria para referendar a decisão no mesmo dia.

No dia 17 de dezembro, o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) acionou o STF contra uma manobra do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que levou à indicação, ao Executivo, de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão para pagamento, ainda neste ano, sem as regras de transparência.

Na última segunda-feira (23), Dino atendeu ao pedido e suspendeu o pagamento dos R$ 4,2 bilhões de reais em emendas, além de solicitar a abertura de um inquérito pela Polícia Federal para apurar supostas irregularidades.

O ministro determinou que a Câmara deveria cumprir as seguintes determinações:

  • Publicar no site as atas das reuniões das comissões permanentes na quais foram aprovadas 5.449 emendas;
  • Ao lado de cada emenda de comissão (RP8), informar a ata exata em que consta a aprovação da emenda;
  • Cada ata precisa vir com informação de qual foi o meio empregado para a publicidade da emenda, na época de produção e aprovação;
  • Encaminhar à Secretaria de Relações Institucionais (SRI) por ofício, cópia de todas atas;
  • Informar nos autos o cumprimento da determinação, com indicação do link de acesso para as informações e cópia do ofício enviado à SRI;

Na quinta-feira (26), Lira interrompeu o recesso dos parlamentares e convocou uma reunião com os líderes partidários. Segundo apuração do âncora da CNN Gustavo Uribe, o objetivo principal do encontro era discutir a eleição para cargos na Mesa Diretora, no entanto, fontes diziam ser inevitável não tratar sobre o bloqueio das emendas.

No dia seguinte, Lira se reuniu com o presidente Lula, em um encontro solicitado pelo próprio chefe do Executivo, para discutir os aspectos legais da divisão das emendas de comissão.

Ainda na sexta-feira (27), a Câmara dos Deputados apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) as respostas solicitadas por Flávio Dino.

De acordo com a Câmara, a liberação das emendas seguiu a tramitação correta segundo pareceres dos ministérios da Fazenda, do Planejamento e Orçamento, da Gestão, da Casa Civil e da Advocacia-Geral da União (AGU).

 

*Com informações de Débora Bergamasco, Jussara Soares, Luísa Martins, Leonardo Ribbeiro e Lucas Mendes, da CNN

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