Ceticismo é a palavra que define o sentimento dos economistas com os anúncios feitos pelo Governo Federal com relação ao pacote fiscal.
A economia de R$ 70 bilhões esperada pela Fazenda é considerada positiva para auxiliar no cumprimento do arcabouço fiscal. Contudo, especialistas dizem que faltam mudanças estruturais que possam colocar a dívida pública em uma trajetória sustentável no longo prazo.
“O mercado está aguardando algo mais concreto. Era esperado um corte de gastos, mas veio um novo gasto que tem de ser coberto. O Brasil precisa criar uma taxa de redução de dívida que seja maior do que a taxa de gastos e isso não está equilibrado. A tendência é de que o governo continue subindo impostos para poder conter o rombo, porque a escalada da dívida sempre será maior do que a receita”, explica Charo Alves, especialista da Valor Investimentos.
Durante a fala do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o dólar disparou e chegou a bater R$ 5,99, maior valor da história.
A isenção do imposto de renda para contribuintes que ganham até R$ 5 mil é o principal ponto de preocupação para o mercado. Os economistas consideram pouco factível que a compensação através da taxação daqueles que ganham acima de R$ 50 mil se concretize.
Em comunicado ao mercado, a EQI Research reforçou que falta detalhamento das medidas.
“A sensação inicial é de que o esforço de corte de gastos potencial foi ofuscado pelo novo patamar de isenção de IR. Algumas estimativas apontam para uma perda de arrecadação de R$40 bilhões por ano aproximadamente e a compensação desse montante sobre uma base pequena de contribuintes de alta renda será desafiadora”, diz a nota da consultoria.
A avaliação final é de que as incertezas do mercado permanecerão, mesmo após a coletiva técnica do governo.
Tiago Sbardelotto, Economista da XP, considera o pacote como “modesto”, mas aquém do necessário para controlar a trajetória da dívida pública.
“Há mudanças no BPC que tendem a gerar alguma economia duradoura, reduzindo a elegibilidade do benefício. As alterações no FGDF (fundo constitucional do Distrito Federal) também devem ter um impacto permanente e importante a longo prazo. No Fundeb, a realocação pode trazer economia, embora nossa estimativa seja menor do que a do governo”, explica.
Apesar de pontos positivos, a leitura é de que a maior parte do pacote anunciado traz apenas maior flexibilidade na gestão, permitindo cortes de despesas, ou inclui medidas já vigentes.
“As mudanças nas emendas, já aprovadas, não trazem economia real, apenas transferem parte das emendas não impositivas do orçamento legislativo para o executivo”, diz Sbardelotto.
A equipe econômica do governo projeta uma economia de R$ 327 bilhões até 2030. Desse total, o governo espera impacto de R$ 71,9 bilhões até 2026, fim do mandato de Lula.
Entenda o pacote
As sinalizações de medidas para corte de gastos pelo ministro da Fazenda vêm sendo divididos em seis frentes:
- 1. Limitação do avanço do salário mínimo dentro do arcabouço (podendo crescer ao máximo 2,5% somados à inflação)
- 2. Correção do limite de acesso ao abono salarial pela inflação até que o teto caia a um salário mínimo e meio
- 3. Mudanças na aposentadoria militar, com idade mínima para ir à reserva e limitação na transferência de pensões;
- 4. Sujeição de agentes públicos ao teto constitucional, o que levaria ao fim dos chamados “supersalários”;
- 5. Crescimento das emendas globais dentro do arcabouço e destinação de 50% das emendas de comissão para a saúde
- 6. Aperfeiçoamento dos mecanismos de controle de fraudes e distorções, especialmente para o BPC (antiga aposentadoria por invalidez)
As medidas apresentadas por Haddad ainda precisam ser votadas e aprovadas pelo Congresso Nacional.