A Frente Parlamentar do Biodiesel (FPBio) deve se reunir nesta semana com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para explicar as razões para a escalada de quase 30% no preço do óleo de soja em 2024 e tentar mostrar que a culpa para a inflação desse item, que preocupa o Palácio do Planalto, não é do aumento da produção do biocombustível no país.
O objetivo é fazer uma gestão de informações técnicas com a equipe econômica e blindar o setor de possíveis intervenções, principalmente na mistura do biodiesel ao diesel fóssil, que passará de 14% para 15% em março. Há possibilidades também de acionar o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, além dos chefes da Agricultura, Carlos Fávaro, e de Minas e Energia, Alexandre Silveira, para ajudar nessa defesa.
Há um receio, mesmo que incipiente, de que o ruído causado pela fala recente do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sobre o possível impacto do biocombustível no óleo de cozinha, possa influenciar alguma tentativa de impedir o aumento da mistura. A medida teria que ser aprovada no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que tem reunião marcada para o dia 18 de fevereiro. Não há previsão de discussão sobre biodiesel na pauta.
“Eu quero saber se a soja para o biodiesel está criando problema; quero saber se o milho para o etanol está criando problema”, disse Lula em entrevista coletiva na semana passada.
João Henrique Hummel, diretor-executivo da FPBio, disse que “se o governo for coerente”, o risco de mexer na mistura do biodiesel agora é “zero”. A avaliação tem como base a recente sanção, pelo próprio presidente Lula, da lei do Combustível do Futuro que prevê incentivos e previsibilidade para investimentos e aumento de produção e consumo do biodiesel e outros produtos.
Qualquer interferência nesse mercado agora, poucos meses após a sanção da lei com um evento prestigiado na Base Aérea de Brasília, pode gerar uma queda de credibilidade da pauta verde do governo em ano de realização da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30) no Brasil — além de atrapalhar os planos de expansão do setor. Na reunião com a equipe econômica, a intenção é desabonar o discurso de competição entre a produção de energia e de alimentos.
A Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), a Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio) e a União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio) não consideram “nenhuma possibilidade de retrocesso” em relação à mistura.
As entidades ressaltam que a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) já estabeleceu as metas de contratação para 2025 e que as usinas já estão adquirindo matéria-prima para atender à nova demanda das distribuidoras, com o B15.
“Qualquer mudança na mistura prevista impactaria contratos em vigor e poderia desestruturar a cadeia produtiva do óleo e do farelo de soja, com consequente impacto nos preços de alimentos na gôndola dos supermercados”, afirmaram, em nota.
As entidades ressaltaram que a alta no preço do óleo de soja é reflexo da entressafra, do aumento da demanda chinesa por soja brasileira, da instabilidade no mercado de óleo de palma e da variação cambial. As associações ponderam ainda que o cenário já está em reversão e que desde janeiro os preços do óleo refinado têm registrado quedas.
“O biodiesel não tem nenhuma relação com essa variação. Pelo contrário, a sua produção impulsiona o esmagamento da soja, elevando a oferta de farelo usado em rações, impactando na redução dos custos de produção de alimentos”, disseram as entidades, em nota
Cálculos feitos pelo setor do biocombustível mostram que o aumento da mistura ao diesel fóssil, de B14 para B15, deve gerar impacto de apenas R$ 0,01 no preço nas bombas aos consumidores — valor considerado irrisório pelo setor frente aos R$ 0,22 de elevação anunciados recentemente pela Petrobras.
O setor deve mostrar ainda que outro motivo para a alta, não só do óleo de soja, mas dos alimentos como um todo, foi o aumento do imposto de importação de materiais industriais, como resinas termoplásticas usadas em embalagens, em setembro de 2024, de 12,6% para 20%.
Uma análise técnica da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), diz que os preços do óleo de soja começaram a reagir a partir de março de 2024, quando a mistura do biodiesel — produzido a partir da oleaginosa — no diesel passou de 12% para 14%. Mas o biocombustível não é vilão, alerta a entidade. Os óleos vegetais foram os produtos que mais aumentaram em 2024 de acordo com o índice de inflação de alimentos da FAO, pontua a CNA. Os preços desses produtos já caíram em janeiro 5,6% em janeiro.
Em 2025, a produção brasileira de óleo de soja deve alcançar 11,5 milhões de toneladas, das quais 3,8 milhões são destinadas ao mercado alimentício, 6,7 milhões para a produção de biodiesel e 1 milhão para exportação. Se confirmado, será um volume de 500 mil toneladas a mais em relação a 2024.
Foco nas carnes
O setor produtivo do biodiesel também está encampando uma ideia para promover a produção e a exportação de carnes pelo Brasil. Em março, a FPBio vai apresentar um projeto de lei para instituir uma política nacional de promoção exterior das carnes brasileiras. A proposta já foi apresentada a alguns membros do governo, como do Itamaraty.
A ideia é mostrar que a cadeia do biocombustível fomenta a expansão da produção e o barateamento dos preços das carnes no país. Isso porque o aumento do uso do biodiesel impulsiona o esmagamento de soja, que gera mais farelo, usado como ração animal.
O reflexo não deve ser apenas no preço interno. Com mais produção, a carne brasileira ficará ainda mais competitiva para a exportação, com potencial de impactar positivamente para controlar a inflação de alimentos no mundo.
Em 2024, já houve a apresentação de uma emenda na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para obrigar que 30% do orçamento da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) fosse utilizado na divulgação das proteínas animais ao redor do mundo. O texto, no entanto, não foi aprovado.
A nova política também pode basear uma campanha para combater as críticas internacionais, da Europa e dos Estados Unidos, ao setor produtivo nacional, principalmente na área ambiental.
Nesse contexto, o aumento da produção de biodiesel fomenta a industrialização do país e a geração de mais empregos, defende a FPBio.