O ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, votou nesta quarta-feira (26) a favor do recebimento da denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o “núcleo crucial” de uma tentativa de golpe de Estado. Para embasar seu posicionamento, o magistrado relembrou uma série de fatos e declaração do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para reforçar a “materialidade” da existência dos crimes indicados na denúncia.
Os atos do 8 de janeiro de 2023, a reunião com embaixadores realizada pelo então presidente Bolsonaro em julho 2022, e a “minuta do golpe” apreendida pela Polícia Federal (PF) foram citadas na fala de Moraes.
O ministro é o relator do caso e o detalhamento do seu voto durou 1h50. Os demais ministros ainda estão proferindo seus votos, mas já há maioria formada para aceitar a denúnica. A Primeira Turma julga nesta quarta se tornará réu ou não os oito denunciados pela PGR, incluindo Bolsonaro, que integram o núcleo 1 da organização criminosa.
Na sessão, Moraes leu trechos da denúncia da PGR e destacou os argumentos sobre cada crime denunciado. O magistrado afirmou que a denúncia seguiu todos os requisitos estabelecidos pelo Código de Processo Penal.
“O que se exige da denúncia é a comprovação da materialidade dos delitos imputados aos denunciados e a materialidade dos delitos já foi reconhecida por esse Supremo em 474 denúncias que têm idêntica materialidade, os mesmos crimes narrados”, disse.
8 de janeiro
Moraes exibiu na sessão um vídeo sobre os atos de 8 de janeiro e refutou o argumento de que ocorrido não tinha motivação de violência.
“É bom lembrar que tivemos tentativa de golpe de Estado violentíssima. Fogo, destruição de patrimônio público, dano qualificado. Uma violência selvagem, incivilidade total, com pedido de intervenção militar no golpe de Estado”, afirmou.
Segundo ele, a data foi uma “verdadeira guerra campal” que contou com o rompimento de barreiras de segurança e resultou em policiais feridos.
“Nenhuma Bíblia é vista e nenhum batom é visto nesse momento”, disse o magistrado durante a exibição de imagens dos atos criminosos.
Reunião com embaixadores
De acordo com Moraes, o ex-presidente Jair Bolsonaro, enquanto exercia mandato, organizou a estratégia para a divulgação de informações falsas sobre sistema eleitoral. Ele mencionou o ataque às urnas eletrônicas “sem nenhum fundamento” e o uso de milícias digitais para a divulgação de desinformação.
Em julho de 2022, Bolsonaro e ministros participaram de uma reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada e que foi transmitida nas redes sociais. No encontro, Bolsonaro desacreditou a confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro.
Ainda sobre as urnas, Moraes mencionou que Bolsonaro barrou e interferiu na divulgação dos resultados da comissão das Forças Armadas constituída para acompanhar as eleições.
Em junho de 2023, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) considerou Bolsonaro inelegível até 2030 por prática de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação durante reunião com embaixadores.
Minuta de golpe
O documento que ficou conhecido como “minuta de golpe” também foi mencionado por Moraes. Ele destacou que Bolsonaro “conhecia, manuseava e discutia” o texto elaborado.
O documento foi apreendido na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres e no celular do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
A minuta tratava de um Estado de Sítio e a Operação de Garantia da Lei e da Ordem. O texto seria um instrumento jurídico para contestar o resultado das eleições de 2022.
Durante o voto, Moraes também mencionou que Bolsonaro, em 7 de setembro de 2021, anunciou que não cumpriria mais decisões judiciais durante ato no feriado realizado na Avenida Paulista. O ministro ironizou e chamou de “palavras carinhosas” os xingamentos ditos por Bolsonaro em relação ao magistrado. Na data, o então presidente chamou Moraes de “canalha”.
Denunciados
Moraes aceitou integralmente a denúncia da PGR contra:
- Jair Bolsonaro, ex-presidente da República
- Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor-geral da Abin;
- Almir Garnier, ex-comandante da Marinha do Brasil;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal;
- Augusto Heleno, general e ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);
- Mauro Cid, tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
- Paulo Sérgio Nogueira, general e ex-ministro da Defesa;
- e Walter Braga Netto, general e ex-ministro da Casa Civil e da Defesa, além de ter sido candidato a vice de Bolsonaro em 2022.
Os integrantes do núcleo foram denunciados pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima, e deterioração de patrimônio tombado.
Os ministros Flávio Dino e Luiz Fux acompanharam o relator. Os demais ministros da Primeira Turma ainda devem votar no caso, são eles: Cristiano Zanin (presidente) e Cármen Lúcia.
Caso aceite a denúncia da PGR, o Supremo tornará os denunciados réus e eles passarão a responder a um processo judicial. No fim da ação, eles serão absolvidos ou condenados, com penas a serem definidas pelos magistrados.