O setor avícola brasileiro entrou em estado de alerta após o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) confirmar a presença do vírus da influenza aviária de alta patogenicidade (IAAP), conhecido como gripe aviária, em uma granja de Montenegro, no Rio Grande do Sul, na última sexta-feira (16/5).
O anúncio da doença contagiosa no estabelecimento comercial com mais de 17 mil aves matrizes não causou apenas o isolamento da área para dar início ao protocolo sanitário ou a declaração de estado de emergência zoossanitária no município gaúcho por 60 dias. Além das medidas tomadas pelas autoridades brasileiras, diferentes países decidiram suspender as importações de produtos avícolas do Brasil ou apenas do Rio Grande do Sul.
O que é a gripe aviária e como se transmite?
A gripe aviária é uma doença altamente contagiosa causada por variantes do vírus influenza e atinge aves silvestres, domésticas e também mamíferos, como o gado. No mundo, o primeiro foco foi identificado em 1878, na Itália, e era chamado de praga aviária. A classificação como influenza A aconteceu somente 77 anos depois.
O Brasil ainda não havia registrado a presença do vírus em aviários. Os casos no país, até o momento, conforme o Ministério da Agricultura, haviam sido em aves silvestres e criações de subsistência, todos a partir de 2023.
Os principais vetores da doença são as aves migratórias, como patos, marrecos, gansos e cisnes, considerados hospedeiros naturais, que transmitem o vírus pelas secreções, como fezes e fluidos corporais.
Onde o caso aconteceu?
O vírus da influenza aviária de alta patogenicidade (IAAP) foi identificado em uma granja comercial de Montenegro, município na região Metropolitana de Porto Alegre.
De acordo com a Secretaria da Agricultura do Estado, a suspeita de síndrome respiratória e nervosa foi identificada no dia 12 de maio. Amostras coletadas e encaminhadas ao Laboratório Federal de Diagnóstico Agropecuário, em Campinas (SP), confirmaram o diagnóstico de gripe aviária.
“Eram dois galpões. No primeiro espaço, 100% das galinhas morreram. No segundo, a mortalidade foi de 85%”, disse a coordenadora do Programa Estadual de Sanidade Avícola, Amanda Kowalski.
Quais as medidas de segurança tomadas?
No plantel onde o caso foi detectado haviam mais de 17 mil aves. Os animais encontrados ainda vivos foram sacrificados. O relatório encaminhado pelo Ministério da Agricultura à Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) diz que até 15 de maio, data da confirmação, o Ministério da Agricultura afirmava que eram 7.389 aves mortas.
Já na sexta-feira (16/5), em coletiva na Secretaria da Agricultura do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, técnicos do governo gaúcho afirmaram que a mortalidade foi maior.
Após a confirmação da doença em Montenegro, o Serviço Veterinário Oficial do RS (SVO-RS) isolou a área e iniciou o protocolo sanitário, com a eliminação das aves. Além disso, uma área de dez quilômetros ao redor do aviário será investigada, processo que inclui a instalação de barreiras.
Conforme o governo gaúcho, as 500 propriedades rurais próximas à granja serão visitadas e inspecionadas como medida de segurança.
Há outros casos no Brasil?
Sim, mas não em granjas comerciais. Em Sapucaia do Sul, também na Região Metropolitana de Porto Alegre, 90 aves aquáticas, entre cisnes, patos e marrecos, morreram devido à gripe aviária no Parque Zoológico nesta semana. Enquanto o caso é investigado, o local encontra-se fechado para visitação e sem previsão de reabertura.
Segundo a Secretaria do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul, as mortes destas aves ocorreram repentinamente, sem sintomas específicos.
Nesta segunda (19/5), a Agência de Defesa Agropecuária do Tocantins (Adapec) informou, em nota, que o laudo preliminar do exame laboratorial sobre o caso suspeito em criação comercial de Aguiarnópolis (TO) deu negativo para gripe aviária de alta patogenicidade.
Em Santa Catarina, a presidente da Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola do Estado (Cidasc), Celles Regina de Matos, afirmou que ainda aguarda o resultado dos exames relacionados ao caso suspeito em criação comercial de Ipumirim (SC).
Outras quatro investigações estão em andamento, mas em criatórios de subsistência nos Estados de Mato Grosso, Ceará, Sergipe e Rio Grande do Sul.
Há risco para o consumo de produtos?
Após confirmar o foco de gripe aviária na granja comercial do Rio Grande do Sul, o governo federal tranquilizou a população afirmando que não há risco de transmissão pelo consumo de carne e ovos.
“A população brasileira e mundial pode se manter tranquila em relação à segurança dos produtos inspecionados, não havendo qualquer restrição ao seu consumo”.
A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e a Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav) também destacaram que, apesar da ocorrência ser preocupante para o setor, não representa qualquer risco ao consumidor.
Humanos podem pegar gripe aviária?
Sim, mas o risco é baixo e ocorre, na maioria dos casos já registrados no mundo, entre os profissionais que têm contato intenso com aves infectadas e o ambiente.
Em 2024, em entrevista à Globo Rural, a médica infectologista Gisele Borba, especialista do Serviço de Controle de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde (SCIRAS) do Hospital Universitário Onofre Lopes da Rede EBSERH, em Natal (RN), afirmou que o principal risco da gripe aviária em humanos é a alta letalidade – superior a 50%. “Não quer dizer que qualquer pessoa que pegou vai morrer, claro, mas é bem alto”.
Os sintomas são semelhantes à gripe comum, como dor de cabeça, dor de garganta, coriza e febre alta. Em casos mais graves, os pacientes podem evoluir para quadros de insuficiência respiratória e morte.
Quais os impactos para o Brasil?
Horas após a confirmação do primeiro caso de gripe aviária em uma granja comercial da história, China e União Europeia suspenderam as importações de produtos da avicultura do Brasil. A medida já era esperada pelo governo e representantes da avicultura nacional, pois é previsto no protocolo sanitário.
“Trata-se do cumprimento acordado entre os países, que impede a certificação na detecção da enfermidade”, disse Allan Rogério Alvarenga, secretário-adjunto de Defesa Agropecuária.
Depois de China e União Europeia, a Argentina também bloqueou as importações do Brasil, mas irá manter a compra de genética avícola, com permissão para a entrada de aves de um dia e ovos férteis, desde que provenientes de compartimentos autorizados pela agência sanitária argentina.
Nesta segunda (19/5), a lista de importadores com bloqueio total para os produtos avícolas brasileiros somam dez.
O governo brasileiro já está em contato com importadores para tentar diminuir o impacto do caso sanitário nas exportações. Na manhã desta segunda, técnicos do Ministério da Agricultura conversaram com autoridades da África do Sul. O objetivo é que a restrição, que atinge todo o país, seja limitada ao Estado do Rio Grande do Sul ou ao município.
Perda financeira
A indústria brasileira não faz previsões sore quanto o segmento deixará de exportar, mas uma fonte do governo estima que o número pode ser de US$ 250 milhões por mês. Fábio Silveira, economista da MacroSector, acredita que o número alcance US$ 1 bilhão no prazo de até 12 meses.
O Brasil é o maior exportador de carne de frango do mundo e embarcou 5,294 milhões de toneladas do produto (in natura e industrializado) em 2024, o que gerou uma receita de cambial de US$ 9,928 bilhões.