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As amostras trazidas do asteroide Bennu pela missão OSIRIS-REx, da NASA, continuam a revelar detalhes importantes sobre os primeiros passos da química que antecedeu a vida na Terra. Mais de dois anos após a chegada dos 121 gramas de material coletado, novos estudos apresentam descobertas que ampliam o entendimento sobre a composição desse corpo celeste.
Nas análises mais recentes, pesquisadores identificaram justamente o último ingrediente que faltava entre os blocos químicos já detectados no material. A partir dessas novas evidências, Bennu reúne, pela primeira vez em uma amostra extraterrestre preservada, todos os componentes necessários para formar moléculas fundamentais à biologia.

Açúcares essenciais encontrados em Bennu
Em uma série de artigos publicada em periódicos científicos, equipes de pesquisa relatam a presença de açúcares importantes para processos biológicos. O grupo liderado por Yoshihiro Furukawa, da Universidade de Tohoku, detectou o açúcar de cinco carbonos ribose e, pela primeira vez fora da Terra, o açúcar de seis carbonos glicose.
Esses resultados se somam às descobertas anteriores de todos os cinco nucleotídeos usados na formação de DNA e RNA, além de possivelmente 15 aminoácidos. Com a confirmação da ribose, os cientistas apontam que Bennu contém todos os elementos necessários para montar uma molécula de RNA.

“A nova descoberta de ribose significa que todos os componentes para formar a molécula de RNA estão presentes em Bennu”, afirmou Furukawa. Ele destacou que os nucleobases e fosfatos já haviam sido identificados nas amostras.
A ribose já havia sido encontrada em meteoritos que caíram na Terra, mas sua detecção em um material primitivo e intacto, coletado diretamente no espaço, reforça teorias que relacionam compostos orgânicos transportados por asteroides ao surgimento da vida. Não há evidências, porém, de desoxirribose, que forma o DNA. Os pesquisadores sugerem que o ambiente do corpo progenitor de Bennu pode não ter sido adequado para sua formação.
Possível “RNA primeiro” no início da vida
Os estudos destacam que o início da vida pode ter sido baseado em estruturas químicas mais simples. O RNA é considerado um forte candidato a ter desempenhado papel fundamental nesse processo, já que pode armazenar informações genéticas e atuar como catalisador em reações biológicas.
“A vida atual depende de sistemas complexos organizados por DNA, RNA e proteínas”, explicou Furukawa. “Mas formas iniciais de vida podem ter operado com base apenas no RNA.”
As evidências químicas reforçam a hipótese de que Bennu se formou a partir dos fragmentos de um corpo muito maior. O asteroide Ryugu, estudado pela sonda japonesa Hayabusa2, também pode ter surgido dessa mesma origem. Observações anteriores já sugeriam que esse protoplaneta possuía água e calor, condições favoráveis a reações químicas complexas.

Pesquisadores identificam “goma espacial” nas amostras
Outro estudo, conduzido por Scott Sandford (NASA Ames Research Center) e Zack Gainsforth (Universidade da Califórnia, Berkeley), revelou um material inusitado: um polímero de origem antiga, inicialmente macio, que endureceu com o tempo. Os cientistas chamam a substância de “goma espacial”, rica em nitrogênio, carbono e oxigênio.
O ponto de partida seria o composto carbamato, formado naturalmente quando amônia e dióxido de carbono são submetidos à radiação. Com o tempo, o carbamato teria se polimerizado e reagido com outras moléculas, criando esse material que representa uma das primeiras transformações registradas no asteroide.
“Com essa substância estranha, estamos observando, possivelmente, uma das alterações mais antigas nos materiais presentes na rocha”, disse Sandford. “Estamos olhando para eventos do início do início.”
Um arquivo químico de 4,5 bilhões de anos
As descobertas reforçam o papel de Bennu como um arquivo preservado dos primeiros momentos do Sistema Solar. O asteroide permanece como uma fonte rica de moléculas complexas, mantidas intactas por cerca de 4,5 bilhões de anos.
Os trabalhos científicos que apresentam os novos resultados foram publicados em Nature Geoscience (sobre os açúcares) e Nature Astronomy (sobre a “goma espacial”).








